Pacientes com histórico de COVID-19 podem fazer procedimentos estéticos?

Com o retorno às atividades clínicas, muitos profissionais da Estética se deparam com outra preocupação decorrente da pandemia: pacientes que enfrentaram a COVID-19 podem ser submetidos a procedimentos estéticos?

Essa é uma pergunta que eu tenho recebido com frequência, e acredito que por algum tempo ainda teremos que nos debruçar sobre ela. Por ora, precisamos nos cercar dos melhores estudos sobre a doença e suas sequelas, além de nos dedicarmos com ainda mais esmero à biossegurança e à avaliação do paciente.

As primeiras pesquisas divulgadas indicavam as reações mais comuns nos profissionais da Saúde, que trabalham na linha de frente do combate à doença. Sabe-se que as manifestações cutâneas observadas decorrem do uso de equipamentos de proteção individual.  Ocorre que esses itens podem causar doenças de pele e/ou agravar afecções pré-existentes, como: 


– Pápulas inflamatórias faciais após uso prolongado de óculos e máscaras de proteção, que inclusive podem promover o surgimento de acne, o agravamento da rosácea, dermatite seborreica e coceira facial;

– Hiperidrose estimulada pelo uso de EPIs também pode resultar em um risco maior de infecções bacterianas;    

– O uso prolongado de luvas pode causar hiperidrose e hiperidratação da camada córnea, promovendo perturbações da função de barreira epidérmica, maceração e erosão da pele, o que por sua vez aumenta o risco de dermatite de contato.

Mas, e quando o assunto não são os profissionais da Saúde, mas sim, pacientes que chegam em nossas clínicas com histórico de COVID-19?

Até o momento, não existe nenhuma pesquisa abordando o assunto de forma direta. Entretanto, um estudo realizado na Itália relatou que erupções cutâneas foram observadas em até 20% dos pacientes com COVID-19. E, em alguns casos, esses sinais foram a única razão pela qual uma pessoa foi testada para COVID-19.

O estudo intitulado Covid-19 Cutaneous Manifestations: Simplifying The Confusion simplificou a classificação das manifestações cutâneas da COVID‐19 em duas categorias com base na fisiopatologia e nos processos reativos:

  • Reativo: as apresentações urticariforme, exantema, morbiliforme e vesicular são manifestações reativas ao coronavírus ou a outro vírus ou medicamento concomitante. Cabe ressaltar que, normalmente, essas manifestações desaparecem quando a infecção diminui.
  • Vasculopatia: Com base na fisiopatologia, as apresentações de frieira, livedo, retiforme ou hemorrágico, são consideradas uma variação das vasculopatias leves a moderadas ou graves. 

Nós, profissionais que trabalhamos com Estética, devemos estar atentos durante a anamnese ao histórico de vasculopatia do paciente, e, nesses casos, jamais optar por recursos que venham a estimular tais lesões – se as mesmas ainda se fizerem presentes.         

A vasculopatia pode ser caracterizada como tipos de doenças vasculares que começam com dano endotelial acral e trombos microvasculares que podem ser bastante leves, mas podem progredir para uma trombose sistêmica grave, em grandes vasos sanguíneos venosos e arteriais, com mau prognóstico.

Além das manifestações cutâneas supracitadas, vem aumentando o número de relatos de uma condição inflamatória, difusa e multissistêmica em adultos expostos à infecção, sendo essa conhecida como Síndrome pós-Covid-19.

Tudo isso ainda é muito novo e, infelizmente, mal compreendido. O Sistema Nacional de Saúde Inglês descreveu que os pacientes que sobreviveram à doença podem precisar de uma atenção especial imediata, e em longo prazo, envolvendo cuidados físicos, neuropsicológicos e sociais. Os profissionais de Saúde devem estar atentos, principalmente, às seguintes questões:  

  • Respiratórias que envolvem disfagia, tosse crônica, fibrose pulmonar, bronquiectasia, entre outras;
  • Neuromusculares associadas a fraqueza muscular e neuropatia;
  • Endocrinológicas (diabetes).

É importante que os profissionais estejam atentos ao bem-estar geral dos pacientes, e sempre com um olhar criterioso para sua saúde mental e social. Avaliar corretamente e estruturar uma boa anamnese, para indivíduos com histórico de COVID-19, pode ser o diferencial entre ter bons resultados ou gerar um possível efeito indesejável.       

Finalizo este texto dando três dicas práticas em relação aos cuidados que devemos ter quando nos deparamos com um paciente com histórico de COVID-19.

1 – Antes de aplicar recursos que promovam lesão controlada na pele (como radiofrequência, criolipólise, entre outros), certifique-se de que seu paciente não apresenta ou não teve alguma das vasculopatias supracitadas.
2 – Quando for aplicar algum recurso que depende do feedback de sensibilidade do paciente para ajustar a dosimetria (como aparelhos de corrente elétrica), esteja certo de que o paciente não tem nenhuma neuropatia;
3 – Na síndrome pós-Covid-19, manifestações neuromusculares associadas à fraqueza muscular podem estar presentes; então, sempre avalie antes de propor tratamentos que venham a exigir destes sistemas, como ocorre no uso da plataforma vibratória, por exemplo.

E me despeço desejando um feliz 2021 aos estimados leitores!

FRASE “Avaliar corretamente e estruturar uma boa anamnese para indivíduos com histórico de COVID-19 pode ser o diferencial entre ter bons resultados ou gerar um possível efeito indesejável”

Dr. João Tassinary (@joaotassinary) possui graduação em Fisioterapia e em Biomedicina com ênfase em Estética, mestrado em Ambiente e Desenvolvimento pela Universidade do Vale do Taquari – Univates, e doutorado em Medicina e Ciências da Saúde, na área de Clínica Médica, pela Faculdade de Medicina da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, com período intercalar na Universidade de Barcelona, junto ao Hospital Duran y Reynals, no Campus de Bellvitge.

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